Olho com alguma preocupação para as notícias que têm surgido nos últimos tempos. A forma como os media têm caracterizado os conflitos ocidente-oriente e a forma como os países e, mais em concreto, os indivíduos têm encarado esta problemática.
Em primeiro lugar, tenho de deixar bem claro que, para mim, tanto as caricaturas, que ainda não vi, como os actos de violência consequentes são de extrema gravidade e de igualdade influência nesta tensão crescente.
Tenho lido e visto muitas coisas nos meios de comunicação sobre a problemática, mas preocupa-me sinceramente a forma como as notícias continuam a ser vinculadas. Com apelos mais ou menos subliminares à violência, à raiva, ao ódio e ao separatismo.
Vivemos todos no mesmo planeta. Não tenho dúvidas disso, e julgo que ninguém as terá. No entanto, mesmo vivendo num planeta tão “pequeno” continuamos a julgar, analisar e agir, de acordo apenas com a nossa visão e perspectiva sem perceber uma verdade que parece universal: existem realidades, perspectivas, fés e comportamentos que não entendemos. Que pertencem a outro enquadramento social, cultural, religioso, onde coisas têm pesos diferentes. E sempre foi assim entre cristãos e muçulmanos.
Para os de memória curta, relembro-vos que há alguns anos atrás um programa de Herman José foi retirado do ar porque “brincava” com figuras históricas e religiosas. Alguns anos mais tarde, o cartoon do Papa e do preservativo trouxe ao de cima mais uma polémica. Além disso, por todo o país há histórias de violência associada a questões religiosas. Seremos assim tão diferentes?
Por outro lado, em França, um país ocidental, tivemos demonstrações de como um problema racial pode tomar proporções incontroláveis. Um exemplo de como a autoridade política, policial e até religiosa é incapaz de deter um crescendo de violência. Seremos assim tão diferentes?
Claro que toda a violência é reprovável. Sob qualquer perspectiva, mas por essa mesma razão temos de agir de forma responsável. E quanto mais audiência tiver a nossa mensagem, maior o cuidado que temos de ter. Os media têm então que equacionar essa questão com rigor. Perceber o mundo em que vivemos e a consequência dos actos e das palavras.
Sinto que vivemos numa pré-cruzada. Tenho a clara sensação do rastilho que se encontra acesso. Uma palavra no sítio “certo” poderá atear uma fogueira sem fim.
E não somos melhores ou piores que os muçulmanos. Somos diferentes. Não podemos avaliar, medir ou catalogar as civilizações sobre a nossa bitola. Temos de criar um quadro de valores universal onde possamos medir as sociedades, mas com valores e perspectivas tanto ocidentais como orientais.
Para nós parece ridículo a violência por causa da liberdade de expressão. Para os muçulmanos é inacreditável que a liberdade de expressão ofenda a sua fé e os seus valores.
O pedido que aqui deixo é particularmente dirigido aos meios de comunicação social. Sejam responsáveis. Sejam sérios e ponderados. Nem tudo é justificável para se conseguir audiências ou vendas. Há limites, principalmente se não queremos uma Terceira Guerra Mundial.
Tolerância, respeito e paz.
A questão que os cartoons levantam é a da liberdade de expressão e de impresa, pilares fundamentais e estruturais dos Estados de Direito.
ResponderEliminarParece contudo sensato dizer que essa liberdade tem de ser articulada com responsabilidade e que nem tudo se deve publicar.
Mas será que o respeito pelo outro obriga ao nosso silêncio?
Será que não podemos hierarquizar valores e dizer que isto vale mais do que aquilo?
Defender que tudo se equivale não é abrir caminho para um relativismo moral segundo o qual não há bem nem mal, apenas o diferente?
Creio que não há qualquer fundamento para justificar que a violência decorra da publicação daquelas ou de outras caricaturas, por mais polémicas que possam ser.
O exagero é próprio da caricatura e reprimi-lo é abrir a porta a uma forma de controlo da liberdade de expressão e de imprensa que só pode conduzir a maus resultados.
Nos Estados de Direito a forma de contestar a violação de direitos e de repor os danos está tipificada na lei e em nada se assemelha com aquela forma de violência.
Amigo Franquet, um comentário às tuas palavras, que como sempre agradeço:
ResponderEliminarÉ óbvio que a questão dos cartoons tem que ver com a liberdade de expressão, mas também com o respeito pelos indivíduos (que também me parecem representar pilares de um estado de direito).
"Mas será que o respeito pelo outro obriga ao nosso silêncio? (...)Defender que tudo se equivale não é abrir caminho para um relativismo moral segundo o qual não há bem nem mal, apenas o diferente?"
Não hierarquizei a questão, não por considerar os dois actos de igual gravidade, mas por ter dificuldade de os analisar hermeticamente, sem estarem interligados.
Como também disse, nada justifica actos de violência. Nem do lado muçulmano, nem do lado "ocidental". Até porque a violência funciona em espiral.
Em relação a limitações e liberdades, parece-me que estas são inseparáveis também num estado de direito. Como pode existir um direito sem uma obrigação, uma liberdade sem os respectivos limites. Acima de tudo com os media, quem comenta os comentadores?
Concordo que existem muitas formas de contestar sem ser pela violência, mas também a história nos demonstra que fracassamos regularmente nesses processos, por exemplo com a droga, ou a pedofilia.
Por outro lado, os graus do que podemos encarar violência variam em grau e escala também do ponto de vista cultural.
Há civilizações onde negociar um casamento é normal, onde trocar um casamento por outro é normal, onde pagar salários de miséria é normal, onde não oferecer uma educação de qualidade é normal, onde permitir o analfabetismo é normal. Afinal onde começa e acaba a violência?
PS: Quem se não ofende com caricaturas, ás vezes ofende-se mais com outras coisas simples, como comentários menos próprios dos condutores de outras viaturas...
Hoje e enquanto me arranjava para sair de casa, ouvi uma crónica na Antena 1 que me fez algum sentido. Devo dizer que acho estas últimas manifestações muçulmanas excessivas, tal como os "cartoons" (que sabe Deus quando foram publicados e o porquê de só agora estarem a ser divulgados junto das populações). Bom, mas a crónica desta manhã relembrava outras manifestações também elas excessivas: os ataques de 11 de Setembro, de 11 de Março e o último no Metro de Londres, onde morreram milhares de civis ocidentais.
ResponderEliminarFiquei a pensar nas reacções (nos dias que se seguiram a estes ataques) do mundo islâmico e da nossa parte (ocidentais).
E já agora, será que estamos mesmo a falar da liberdade de imprensa, ou a questão prende-se o (tão batido) choque de civilizações?
Não sei qual será o tema central, mas parece-me que esta tensão entre diferentes formas de encarar o mundo poderá fomentar uma terceira guerra mundial ou uma nova cruzada religiosa.
ResponderEliminarJulgo que a solução seja a miscigenação.
Se todos tivessem filhos e relações inter raciais, deixavam de existir duas civilizações, mas apenas uma civilização universal cheia de sexy mestiços e mestiças.
E mesmo que não resulte, pelos menos toda a gente se divertiu a tentar...
Rir-mo-nos de nós próprios é um acto saudável. Rir-mo-nos dos outros pode não ser assim tão saudável...
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