Por Bernardo Ramirez
Nunca é fácil escolher.
Mas a vida é feita de escolhas.
Já há muito tempo ouço sempre dizer: Estes carneiros não param. Tão sempre a correr. Tão sempre a partir. Tão sempre a mudar. Querem o novo pelo novo. São como crianças. Não têm juízo nenhum.
Pois venho aqui informar que somos o princípio! Que somos o primordial! Que somos a essência do início. A força do que começa.
Sem nós não há vida. Sem nós não há novo. Sem nós não há tempo.
Não tememos ousar. E ousamos para não temer. E isto não é a nossa qualidade. Não é o nosso defeito.
ISTO É VIVER.
Há um espaço que não cansa. Há um tempo que corre tranquilo. Há sempre lugar para tudo. Caminhamos com um sorriso. Afinal, há BOM TEMPO NO CANAL. Este é um blog sobre quase tudo, mas principalmente sobre o dia a dia, os acontecimentos, as pessoas e as suas relações.
sexta-feira, 30 de maio de 2008
quinta-feira, 29 de maio de 2008
Líderes de massa!
Estava na estante de uma colega de turma, peguei e perguntei se poderia levá-lo para casa para o ler. Desde o seu apartamento até ao meu fui desfolhando quanto podia aquelas páginas, que se enchiam de significado, quando pensava que foram mensagens levadas ao extremo por alguns seres humanos ainda em construção.
A primeira imagem do livro é uma foto escura, com laivos de clareza pela cor do seu cabelo e casaco, que eram alvos das luzes que envolvem as personagens principais. O seu ar desmazelado e meio pedrado davam a sensação de fragilidade e imaturidade, o que se veio a verificar na sua morte. Viro a página e outra fotografia, mas agora de grande plano, mostra os contornos bem delineados do seu rosto... barba rala, olhos claros, cabelos lisos e compridos, em tom loiro... Não era bonito, mas tinha um certo carisma. Mais à frente vem uma citação de Nietzsche, “Da Morte Voluntária” in Assim Falava Zaratustra.
Outra fotografia; onde mostra um aspecto mais desleixado do que o habitual. Esta contrabalançada com uma outra onde podemos ver a sua debilidade... Por amor de Deus! Ainda dizem que ele é símbolo da nossa geração. Da minha, pelo menos, eu não quero que seja. Pensem comigo, só encontramos líderes de massas que se drogam, bebem e se suicidam, ou são mortos. Isto é a nossa geração?!
Escrevia António Sérgio sobre o nosso menino e dois amigos do mesmo: “...durante algum tempo os portadores na Terra do testemunho da grande Dor.” Não posso acreditar que uma geração cheia de alegrias tenha líderes profetas da grande Dor. Querem torná-los coitadinhos e, depois de mortos, uns Santos. EU NÃO QUERO ESTE CHEFE ESPIRITUAL PARA A MINHA GERAÇÃO! NÃO SOMOS NENHUNS INFELIZES! EU NÃO QUERO KURT COBAIN PARA MEU SÍMBOLO!
Não vou dizer que não gosto do aspecto decadente de grupos como os Nirvana e outros, mas afirmo que não devem ser seguidos, como chefes, por ninguém, pois não são as pessoas que mais valores positivos nos podem transmitir. Julgo não fazer parte de um grupo etário que vive na tristeza. Se isto acontece, parece-me que tem a ver com a má escolha que fizeram, pois nascemos em liberdade e temos quase tudo. Também nascemos com a faculdade de ir à luta e deitar abaixo a infelicidade ou dor; não falo de drogas, nem qualquer outra coisa artificial, refiro-me à vontade interior e à qualidade de uma amizade, não substituída pelo falso amigo que é o charro. Se calhar são balelas de menina teenager, mas eu não quero Kurt Cobain para meu Chefe! NÃO, NÃO, NÃO! NÃO QUERO KURT COBAIN PARA MEU CHEFE! A minha tribo não é essa! Faço parte da tribo de Delfos: conhece-te a ti próprio!
A primeira imagem do livro é uma foto escura, com laivos de clareza pela cor do seu cabelo e casaco, que eram alvos das luzes que envolvem as personagens principais. O seu ar desmazelado e meio pedrado davam a sensação de fragilidade e imaturidade, o que se veio a verificar na sua morte. Viro a página e outra fotografia, mas agora de grande plano, mostra os contornos bem delineados do seu rosto... barba rala, olhos claros, cabelos lisos e compridos, em tom loiro... Não era bonito, mas tinha um certo carisma. Mais à frente vem uma citação de Nietzsche, “Da Morte Voluntária” in Assim Falava Zaratustra.
Outra fotografia; onde mostra um aspecto mais desleixado do que o habitual. Esta contrabalançada com uma outra onde podemos ver a sua debilidade... Por amor de Deus! Ainda dizem que ele é símbolo da nossa geração. Da minha, pelo menos, eu não quero que seja. Pensem comigo, só encontramos líderes de massas que se drogam, bebem e se suicidam, ou são mortos. Isto é a nossa geração?!
Escrevia António Sérgio sobre o nosso menino e dois amigos do mesmo: “...durante algum tempo os portadores na Terra do testemunho da grande Dor.” Não posso acreditar que uma geração cheia de alegrias tenha líderes profetas da grande Dor. Querem torná-los coitadinhos e, depois de mortos, uns Santos. EU NÃO QUERO ESTE CHEFE ESPIRITUAL PARA A MINHA GERAÇÃO! NÃO SOMOS NENHUNS INFELIZES! EU NÃO QUERO KURT COBAIN PARA MEU SÍMBOLO!
Não vou dizer que não gosto do aspecto decadente de grupos como os Nirvana e outros, mas afirmo que não devem ser seguidos, como chefes, por ninguém, pois não são as pessoas que mais valores positivos nos podem transmitir. Julgo não fazer parte de um grupo etário que vive na tristeza. Se isto acontece, parece-me que tem a ver com a má escolha que fizeram, pois nascemos em liberdade e temos quase tudo. Também nascemos com a faculdade de ir à luta e deitar abaixo a infelicidade ou dor; não falo de drogas, nem qualquer outra coisa artificial, refiro-me à vontade interior e à qualidade de uma amizade, não substituída pelo falso amigo que é o charro. Se calhar são balelas de menina teenager, mas eu não quero Kurt Cobain para meu Chefe! NÃO, NÃO, NÃO! NÃO QUERO KURT COBAIN PARA MEU CHEFE! A minha tribo não é essa! Faço parte da tribo de Delfos: conhece-te a ti próprio!
A nossa Assembleia
Sentada num dos bancos reservados aos comuns dos mortais, na Assembleia da República, observo uma enorme bancada vazia que se localiza num plano superior.
Olho para baixo e, mesmo aos meus pés, vejo Manuel Alegre, que está acompanhado por não sei quem. A sua secretária está recheada de jornais e papelada.
No outro extremo da sala, vejo uma senhora vestida, elegantemente, de amarelo. Está sentada na sua cadeira a fazer grandes balões com a sua pastilha elástica.
Mais ao centro, está um senhor esparramachado numa cadeira que mal o suporta. Escusado será dizer que está na sua posição favorita para dormir.
Noutro lugar, estão duas senhoras a falar alegremente, as escrivãs que depressa retornam ao trabalho.
No enorme círculo, para não o chamar de circo, entram e saem pessoas com grande pressa de assinar o livro de presenças e ir embora.
A senhora de amarelo decidiu comer chocolate. Na sala, a tensão é enorme, para aqueles que estão interessados. Esses são os da frente, aqueles que são apanhados pelas câmaras de filmar. Convém dar uma boa imagem deste local de negociações.
Há um senhor que pede qualquer coisa que lhe é trazida num copo transparente. O líquido que contém é escuro. Será café? Será vinho?
E daqui observo como este mundo é tão ridículo e tão efémero. Parece uma telenovela!
Ana Filipa Silva - 1997/1998
No outro extremo da sala, vejo uma senhora vestida, elegantemente, de amarelo. Está sentada na sua cadeira a fazer grandes balões com a sua pastilha elástica.
Mais ao centro, está um senhor esparramachado numa cadeira que mal o suporta. Escusado será dizer que está na sua posição favorita para dormir.
Noutro lugar, estão duas senhoras a falar alegremente, as escrivãs que depressa retornam ao trabalho.
No enorme círculo, para não o chamar de circo, entram e saem pessoas com grande pressa de assinar o livro de presenças e ir embora.
A senhora de amarelo decidiu comer chocolate. Na sala, a tensão é enorme, para aqueles que estão interessados. Esses são os da frente, aqueles que são apanhados pelas câmaras de filmar. Convém dar uma boa imagem deste local de negociações.
Há um senhor que pede qualquer coisa que lhe é trazida num copo transparente. O líquido que contém é escuro. Será café? Será vinho?
E daqui observo como este mundo é tão ridículo e tão efémero. Parece uma telenovela!
Ana Filipa Silva - 1997/1998
sexta-feira, 23 de maio de 2008
Ao meu ser criativo
Querido eu;
Perdoa-me tantas vezes me esquecer de ti. Sabes bem que não é por mal. Não é por falta de amor. Não é por falta. Tantas vezes é por excesso. Excesso de coisas. Excesso de compromissos. Excesso de trabalho. Excessos...
Esqueço-me de ti. Esqueço-me do bem que me fazes. E tu, educado como sempre, deixas-te ficar tranquilo. No teu espaço.
E depois, quando me ponho a andar com a chuva na cara. Ou quando sinto a poesia em mim, lá me surges tu. Discreto e elegante a sorrir e a dizer: "Bem vindo!".
És o meu melhor bem sei. O eu criativo, belo, romântico e inteiro. Que faz o que sente e sente o que faz. E que não compromete nunca quem é.
E esse eu belo é poeta, é bailarino, é cantor, é criador, é facilitador. E é lindo, e é maravilhoso.
E não sei bem onde te perco eu. Não sei bem onde vais parar, ou onde vou eu.
Mas na viagem fico para trás, ou ficas tu. E quero-te perto. E quero-te em mim.
Abraça-me forte!
_____________________________
Bom Conselho
(Chico Buarque)
Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança
Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar
Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade
terça-feira, 20 de maio de 2008
Guiné, amor de pai...
Em 1974, o dia que deu luz à vida de tanta gente afectada pelo poder exarcebado, foi a uma quinta-feira. Na sexta-feira nascia eu, mas seis anos depois, em 1980. Ainda hoje, tenho a mania ignorante de perguntar à minha mãe como é que foi aquele dia, esquecendo-me que não rebentei com a Revolução.
Por sorte não fiquei com o nome Ana da Liberdade que o meu irmão, com mais oito anos do que eu, tanto desejava. Não fiquei com o nome, porém... a minha rebeldia, a força de persistir e de ir à luta sempre me acompanharam. Sinto que fui banhada pela conotação do grande dia. Desde cedo que as pessoas encontram justificação para os meus actos, através da data do meu aniversário. No fundo, eu penso que também o faço.
Embora este dia seja significativo pelo que já descrevi, é ainda mais relevante por ser sinal que injustiças tão cruéis, feitas a homens sem culpa de estarem neste país em anos errados, foram claras, porém nunca apagadas.
Como homenagem ao dia do meu nascimento, tudo o que posso reunir referente à data mais pesada, pela carga negativa que teve de libertar, eu junto numa prateleira do meu quarto que pode, porque vivo depois de Salazar e seus discípulos, ser decorada pelos livros vermelhos, por páginas declarando a sua maldade. A minha família foi afectada por esses tempos. E bem afectada...
Recordo-me de em pequena ir acordar o meu pai e este levantar-se ao gritos, agarrado ao seu braço. Ainda não tinha conhecimentos suficientes para entender o porquê, no entanto já gostava de ver as suas fotografias na Guiné, ao pé da sua tabanca, apertando o mamilo de uma indígena, ou a simulação de uma operação, para além daquelas em que o meu pai parecia um cadáver, mas brincava sorridente com um macaco, para que quando a fotografia chegasse à metrópole, às mãos dos que o amavam e também dos que nada percebiam do que estava a acontecer, como o meu irmão, não ficassem mais derrubados do que já estavam.
Lembro-me também de uma manhã de sol que foi marcada pela queda provocada do meu pai. Hoje, julgo que ele estava a tentar defender-se de algo. Mas, naquele momento, nada entendia. Tal como, concerteza, o meu pai não entendeu porque é que esteve, quase cinco anos afastado da sua família e longe do seu país, respectivamente dois e três anos. Primeiro foi a tropa em Coimbra e Leiria e, de seguida, a ida para Guimpará.
A minha curiosidade levou-me a ler as cartas trocadas naqueles anos. As lágrimas não podiam ficar guardadas. É triste saber que a minha mãe se casou com um homem e viveu vinte e seis anos (mais ou menos) com outro totalmente diferente, vincado por cenários que nada tinham a ver com os de um filho único protegido por seus pais. Um recém-casado que era informado do seu primeiro rebento por telegrama. Ou que recebia os parabéns em papel esverdeado, com umas fitas brancas preenchidas com poucas palavras, porque nos anos 70 portugueses não havia tempo para a família, como tantas vezes ouviram paradoxalmente Salazar proferir: “Pátria, Religião e Família” –
grande triologia. Que cinismo!
O meu pai soube do primeiro dente do meu irmão através de uma carta, tal como soube das suas dores e alegrias, sem ter espaço para interferir nos primeiros tempos de um fruto seu. Ainda hoje e, cada vez mais, atribuo a separação dos meus pais àquele sistema que fez das nossas vidas, as suas paranóias, os seus caprichos e, sobretudo, a sua ignorância.
Vocês não sabem a fúria que tive de conter um dia destes, quando vinha no 46 para Santa Apolónia e no banco de trás um senhor de origem africana dizia que o que falta em Portugal era um homem como Salazar, pois assim não existiriam drogados e violência. Dei tantas voltas naquele banco para não explodir ali e naquele momento. Na minha opinião, não haveria essas características que se sentem na nossa sociedade, porque o próprio tinha a capacidade de produzir a sua particular e muito específica crueldade e dessa fazia parte a droga administrada nos homens que ele escolhia para suas vítimas. E ainda gostaria de salientar que provavelmente o ser que proferiu tais palavras naquele autocarro não deve ter consciência da luta que se travou entre o seu povo e as cobaias de Salazar.
É sentida que dou o meu testemunho. Não se pode pensar no 25 de Abril como a grande festa, esquecendo-nos do significado da mesma perante o passado político do qual nos libertou. Quando digo nós quero englobar esta nova geração que não presenciou o momento, mas que muito beneficiou dele. Como gostaria de ter estado no Maio de 68, em França; também adoraria ter sido absorvida pela beleza daquela quinta-feira, pela magnitude de passagens da nossa história, às vezes, pela distância, esbatidas com outras cores. Recordemos Catarina Eufémia e nomes para com os quais devíamos ter uma atitude de gratidão.
Muito ainda vos poderia dizer, porém seriam pormenores, pois o fundamental é termos a ideia nítida dos pilares do Estado Novo que de novo só tinha a inteligência planeadora do homem que, por mim, nunca deverá ser encarado como o Salvador, até pelo contrário, entendo-o como Serpente, cujo poder não partiu com o seu corpo. Como já ouvi dizer... “Bem-dita cadeira!”.
Por sorte não fiquei com o nome Ana da Liberdade que o meu irmão, com mais oito anos do que eu, tanto desejava. Não fiquei com o nome, porém... a minha rebeldia, a força de persistir e de ir à luta sempre me acompanharam. Sinto que fui banhada pela conotação do grande dia. Desde cedo que as pessoas encontram justificação para os meus actos, através da data do meu aniversário. No fundo, eu penso que também o faço.
Embora este dia seja significativo pelo que já descrevi, é ainda mais relevante por ser sinal que injustiças tão cruéis, feitas a homens sem culpa de estarem neste país em anos errados, foram claras, porém nunca apagadas.
Como homenagem ao dia do meu nascimento, tudo o que posso reunir referente à data mais pesada, pela carga negativa que teve de libertar, eu junto numa prateleira do meu quarto que pode, porque vivo depois de Salazar e seus discípulos, ser decorada pelos livros vermelhos, por páginas declarando a sua maldade. A minha família foi afectada por esses tempos. E bem afectada...
Recordo-me de em pequena ir acordar o meu pai e este levantar-se ao gritos, agarrado ao seu braço. Ainda não tinha conhecimentos suficientes para entender o porquê, no entanto já gostava de ver as suas fotografias na Guiné, ao pé da sua tabanca, apertando o mamilo de uma indígena, ou a simulação de uma operação, para além daquelas em que o meu pai parecia um cadáver, mas brincava sorridente com um macaco, para que quando a fotografia chegasse à metrópole, às mãos dos que o amavam e também dos que nada percebiam do que estava a acontecer, como o meu irmão, não ficassem mais derrubados do que já estavam.
Lembro-me também de uma manhã de sol que foi marcada pela queda provocada do meu pai. Hoje, julgo que ele estava a tentar defender-se de algo. Mas, naquele momento, nada entendia. Tal como, concerteza, o meu pai não entendeu porque é que esteve, quase cinco anos afastado da sua família e longe do seu país, respectivamente dois e três anos. Primeiro foi a tropa em Coimbra e Leiria e, de seguida, a ida para Guimpará.
A minha curiosidade levou-me a ler as cartas trocadas naqueles anos. As lágrimas não podiam ficar guardadas. É triste saber que a minha mãe se casou com um homem e viveu vinte e seis anos (mais ou menos) com outro totalmente diferente, vincado por cenários que nada tinham a ver com os de um filho único protegido por seus pais. Um recém-casado que era informado do seu primeiro rebento por telegrama. Ou que recebia os parabéns em papel esverdeado, com umas fitas brancas preenchidas com poucas palavras, porque nos anos 70 portugueses não havia tempo para a família, como tantas vezes ouviram paradoxalmente Salazar proferir: “Pátria, Religião e Família” –
grande triologia. Que cinismo!
O meu pai soube do primeiro dente do meu irmão através de uma carta, tal como soube das suas dores e alegrias, sem ter espaço para interferir nos primeiros tempos de um fruto seu. Ainda hoje e, cada vez mais, atribuo a separação dos meus pais àquele sistema que fez das nossas vidas, as suas paranóias, os seus caprichos e, sobretudo, a sua ignorância.
Vocês não sabem a fúria que tive de conter um dia destes, quando vinha no 46 para Santa Apolónia e no banco de trás um senhor de origem africana dizia que o que falta em Portugal era um homem como Salazar, pois assim não existiriam drogados e violência. Dei tantas voltas naquele banco para não explodir ali e naquele momento. Na minha opinião, não haveria essas características que se sentem na nossa sociedade, porque o próprio tinha a capacidade de produzir a sua particular e muito específica crueldade e dessa fazia parte a droga administrada nos homens que ele escolhia para suas vítimas. E ainda gostaria de salientar que provavelmente o ser que proferiu tais palavras naquele autocarro não deve ter consciência da luta que se travou entre o seu povo e as cobaias de Salazar.
É sentida que dou o meu testemunho. Não se pode pensar no 25 de Abril como a grande festa, esquecendo-nos do significado da mesma perante o passado político do qual nos libertou. Quando digo nós quero englobar esta nova geração que não presenciou o momento, mas que muito beneficiou dele. Como gostaria de ter estado no Maio de 68, em França; também adoraria ter sido absorvida pela beleza daquela quinta-feira, pela magnitude de passagens da nossa história, às vezes, pela distância, esbatidas com outras cores. Recordemos Catarina Eufémia e nomes para com os quais devíamos ter uma atitude de gratidão.
Muito ainda vos poderia dizer, porém seriam pormenores, pois o fundamental é termos a ideia nítida dos pilares do Estado Novo que de novo só tinha a inteligência planeadora do homem que, por mim, nunca deverá ser encarado como o Salvador, até pelo contrário, entendo-o como Serpente, cujo poder não partiu com o seu corpo. Como já ouvi dizer... “Bem-dita cadeira!”.
Ana Filipa Silva - 1998
segunda-feira, 19 de maio de 2008
Algures nos Açores. Algures na História
por Bernardo Ramirez
Há muito muito tempo, éramos nós umas crianças e estávamos perdidos nos Açores. Dentro de uma bela tenda, numa noite quente de verão, onde os estupefacientes e os narcóticos tinham andado a circular pelas ondas frescas da Horta.
Há muito muito tempo, éramos nós umas crianças e estávamos perdidos nos Açores. Dentro de uma bela tenda, numa noite quente de verão, onde os estupefacientes e os narcóticos tinham andado a circular pelas ondas frescas da Horta.
D. e B. partilhavam uma tenda, e isso era fantástico. Nessa noite B. estava mais para lá do que para cá e confuso e meio tonto olhava incrédulo para D., enquanto esta comia Korn-Flakes misturados com salsichas saídas da lata:
"Estou cheia de fome", dizia D.tentando justificar o injustificável.
"Mas com tanta coisa boa para comer, porque essa porra dessa combinação" - pergunta B.
E D., no momento de loucura esfomeada, olha para B. de olhar arregalado, meia louca, meia cheia de fome, e diz: "Dá-me então a tua banana!"
E assim foi, a partir desse dia a D. passou a ser a D. Banana para o B.
E assim foi, a partir desse dia a D. passou a ser a D. Banana para o B.
quinta-feira, 15 de maio de 2008
Piaçaba
Só para não sermos acusados de mentirosos...
quarta-feira, 14 de maio de 2008
Bom Tempo no Canal Revisitado - Primeiro
No dia 1 de Setembro de 2005 escrevi um dos posts mais divertidos deste blog (na minha opinião), e que também foi o segundo. Chama-se "A Revolta dos Keridos"
"- És um kerido! – já me o disseram muitas vezes. (ou querido, dependendo do contexto escrito ou oral) – Mesmo, mesmo. – reforçam. Acho que existe, e sempre existiu, um desafio essencial no relacionamento entre os homens e as mulheres. Não sei a que se deve, mas é evidente. Os padrões, os valores, as prioridades, a forma de se expressarem são por vezes opostas."
Leiam a "Revolta dos Keridos"
"- És um kerido! – já me o disseram muitas vezes. (ou querido, dependendo do contexto escrito ou oral) – Mesmo, mesmo. – reforçam. Acho que existe, e sempre existiu, um desafio essencial no relacionamento entre os homens e as mulheres. Não sei a que se deve, mas é evidente. Os padrões, os valores, as prioridades, a forma de se expressarem são por vezes opostas."
Leiam a "Revolta dos Keridos"
sexta-feira, 9 de maio de 2008
Num tal cabeleireiro...
É só “tias”!
“Está lindíssima!”- diz uma mulher alta e bem vestida, com um ar de rica e voz bem acentuada pelo seu meio.
Aqui há gente para tudo. Para orientar o trabalho, para lavar o cabelo, para secar, para cortar, para dar conselhos, para pintar... Enfim! É um mar de gente!
Tudo é chamado por “senhora Doutora” ou, então, nem se chama. As mulheres, muito bem vestidas e pintadas, pavoneiam-se com estas futilidades que fazem uma mulher feliz.
“A senhora... (nome estrangeiro que parece marca de um vinho ou talvez um carro).” - diz uma orientadora para a senhora Mary. Podia chamar-lhe Maria, mas em inglês é mais chique.
É um meio tão pomposo e tão irreal, onde tudo tem a maior importância ou, então, a menos possível. Todas já se conhecem e têm um ar de família. Realmente, é esta a família que faz a elite, existindo por consequência e desejo, ou arrogância, uma grande divisão entre a esta e as outras classes sociais.
Uma grande inovação, para mim, que no meu meio não existe... é a do bar no cabeleireiro. Um senhor, com a farda apropriada, leva numa bandeja um café com um copo de água à chiquérrima que é arranjada pelos mais bem pagos, pelo menos em gorjetas.
As mulheres, além de bem vestidas, penteadas e pintadas, também são bem feitinhas, aqui não existe, as gordas desproporcionais. Ou, então, disfarçam muito bem.
Eu, de cabelo curto e sendo uma rapariga modesta, sou atirada para um canto do enorme andar que dá lugar a este centro de negócios e coscuvilhices. Negócios, por ser um cabeleireiro de ricos, e coscuvilhices, por ser um local de conversas sobre as festas e coisas do género.
Claro, eu não tenho um nome estrangeiro e não sou filha do dono da fábrica Renault, em Portugal, como, também “deveria” ser filha de um homem com nome e tradições na família. Não! Sou uma simples rapariga, mas sou feliz, mesmo sendo menos possibilitada monetariamente e não me sendo permitido entrar aqui e ter as pessoas aos pés.
Embora me chamem “Menina...” por gentileza e até sorriam, não me conseguem agradar do mesmo modo como se me tratassem normalmente e com menos indiferença mesclada como com vedetismo.
Ser desta elite... Vejo que é uma grande traição. Mas não pertencer a ela, é uma grande dor, provocada pela estupidez desta gente. Em Portugal, país de tradições, vai-se copiando negativismos desnecessários à nossa sociedade. Já não vivemos em comunidade. Vivemos em comunhão... Cada um com a sua, só que poucas vezes são solenes pela partilha, pois é comunhão sem ser comum.
Ana Filipa Silva - 08 de Janeiro de 1998
“Está lindíssima!”- diz uma mulher alta e bem vestida, com um ar de rica e voz bem acentuada pelo seu meio.
Aqui há gente para tudo. Para orientar o trabalho, para lavar o cabelo, para secar, para cortar, para dar conselhos, para pintar... Enfim! É um mar de gente!
Tudo é chamado por “senhora Doutora” ou, então, nem se chama. As mulheres, muito bem vestidas e pintadas, pavoneiam-se com estas futilidades que fazem uma mulher feliz.
“A senhora... (nome estrangeiro que parece marca de um vinho ou talvez um carro).” - diz uma orientadora para a senhora Mary. Podia chamar-lhe Maria, mas em inglês é mais chique.
É um meio tão pomposo e tão irreal, onde tudo tem a maior importância ou, então, a menos possível. Todas já se conhecem e têm um ar de família. Realmente, é esta a família que faz a elite, existindo por consequência e desejo, ou arrogância, uma grande divisão entre a esta e as outras classes sociais.
Uma grande inovação, para mim, que no meu meio não existe... é a do bar no cabeleireiro. Um senhor, com a farda apropriada, leva numa bandeja um café com um copo de água à chiquérrima que é arranjada pelos mais bem pagos, pelo menos em gorjetas.
As mulheres, além de bem vestidas, penteadas e pintadas, também são bem feitinhas, aqui não existe, as gordas desproporcionais. Ou, então, disfarçam muito bem.
Eu, de cabelo curto e sendo uma rapariga modesta, sou atirada para um canto do enorme andar que dá lugar a este centro de negócios e coscuvilhices. Negócios, por ser um cabeleireiro de ricos, e coscuvilhices, por ser um local de conversas sobre as festas e coisas do género.
Claro, eu não tenho um nome estrangeiro e não sou filha do dono da fábrica Renault, em Portugal, como, também “deveria” ser filha de um homem com nome e tradições na família. Não! Sou uma simples rapariga, mas sou feliz, mesmo sendo menos possibilitada monetariamente e não me sendo permitido entrar aqui e ter as pessoas aos pés.
Embora me chamem “Menina...” por gentileza e até sorriam, não me conseguem agradar do mesmo modo como se me tratassem normalmente e com menos indiferença mesclada como com vedetismo.
Ser desta elite... Vejo que é uma grande traição. Mas não pertencer a ela, é uma grande dor, provocada pela estupidez desta gente. Em Portugal, país de tradições, vai-se copiando negativismos desnecessários à nossa sociedade. Já não vivemos em comunidade. Vivemos em comunhão... Cada um com a sua, só que poucas vezes são solenes pela partilha, pois é comunhão sem ser comum.
Ana Filipa Silva - 08 de Janeiro de 1998
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