quarta-feira, 4 de janeiro de 2006

Sobre Probabilidades e Astrologia


"We believe these sequences reflect a kind of destiny only because we are predisposed to remember the occasions when the sequence seemed to go on for ever, and forget all those other occasions when a promising little sequence went kaput. This is exactly the same as our propensity to recall and fixate on those very rare instances of dreams or horoscopes that appear to ‘come true’, as some must do under the law of averages, and to ignore the countless others which turn out to be groundless and are instantly forgotten." (artigo inteiro aqui)

(Um amigo meu convidou-me a ler este artigo no outro dia, na sua provocadora atitude. E achei que valia a pena desenvolver um comentário mais alargado sobre o tema.)

Todas as ocorrências da nossa vida são cheias de probabilidades: se trabalhar todo o dia conseguirei cumprir o prazo? se estudar este mês vou tirar 20? se carregar na campainha será que ela vai tocar?

Se não vivêssemos num universo de incertezas e de dúvidas estou certo que não viveríamos neste planeta. Seria outro qualquer, com outro nome, com outro valor e com outra importância.

Há obviamente uma correlação matemática com a taxa de sucesso de determinado acontecimento: se sempre que carregamos na campainha ela toca, existirão maiores probabilidades, ou quase totais, que o mesmo se volte a passar. E portanto carregamos e ela toca. Claro que o inesperado pode queimar um fusível, cortar a electricidade, ou avariar a campainha. Mas as probabilidades, neste caso, são claramente a favor do toque.

Obviamente, quando passamos a falar de coisas com seres vivos, os fenómenos complexificam-se e os resultados perdem absolutismo. Será que ela me vai ligar? Será que ele gosta de mim? Será que hoje está bem disposto? Nesta equação as variáveis são mais complexas, porque existem muitos outros factores, diria até um mundo de factores.

Terei de concordar quando, no texto acima, afirmam que temos mais tendência para nos lembrarmos daquilo que nos parece extraordinário, em contraposição a esquecermos o comum ou o que já esperávamos. Isso acontece porque as coisas que caem fora do nosso padrão, da nossa estrutura, surpreendem-nos e por isso guardamo-las na memória. No entanto, acho que a astrologia não tem nada a ver com probabilidades.

Como todo o conhecimento que é adquirido através de investigação e trabalho, torna-se mais "eficiente" conforme o conhecimento aumenta, junto com a experiência. Quanto mais a estudamos, quantos mais mapas olharmos, quanto mais analisarmos os seus aspectos e a forma como interagem, mas saberemos e compreenderemos sobre a natureza ou a acção das pessoas.

Por isso acontece, por vezes, alguém que percebe de astrologia nos referir a probabilidade de algo acontecer, e essa coisa acontecer ou não acontecer. Na verdade, nunca fiz um estudo estatístico da taxa de sucesso das previsões astrológicas, mas também nunca foi essa a área que mais me interessou.

Para mim, em particular, a astrologia permite-nos adquirir um conhecimento suplementar sobre a nossa realidade, sobre quem somos, a forma como vemos o mundo, e a forma como agimos sobre ele.

Não é uma ciência exacta, é uma ferramenta útil, que também pode ser mal utilizada, ou manipulada.

E aqui voltamos ao texto. Se queremos acreditar que algo vai acontecer, se alguém nos diz que sim ou que não, qual será o peso disso no resultado final? Será que acreditarmos nas coisas ajuda-nos a dar-lhes realidade? Eu acredito que sim. Acredito!

Não é matemática, é fé. Porque se alguém que nos ama acredita em nós, se alguém de quem gostamos confia nas nossas capacidades, se nos diz que as coisas vão correr bem então sentimo-nos mais fortes, mais seguros, mais capazes, e isso obviamente favorece um resultado positivo.

Com o contrário também é verdade. Se alguém te disser, antes de começares algo: "não vais conseguir!" é impossível, pelo menos para a maioria de nós afirmar que isso não nos influencia, que não nos deixa inseguros.

É uma relação dialéctica interminável. Se acreditamos temos mais força, se temos mais força fazemos melhor, se fazemos melhor acreditamos mais. E as probabilidades não importam para nada.

Estamos cheios de surpresas neste universo, acontecimentos matematicamente e probabilisticamente impossíveis estão sempre a ocorrer. E por isso se chama vida.

Acreditamos por isso que as sequências dos acontecimentos nos predestinam porque acreditamos que temos um papel activo na nossa vida, porque afinal, ela é nossa.

2 comentários:

  1. Provocador, confrontei o meu amigo Bernardo com um texto escrito por David Runciman, Prof. de Política em Cambridge, do qual tomei conhecimento no Blog Margens de Erro.

    Segundo David Runciman circulam muitas explicações para o sucesso e o insucesso das nossas acções sem qualquer fundamento científico, sem qualquer apoio numa análise probabilística rigorosa. A "mão quente", expressão utilizada no âmbito do basketball, seria emblemática de uma explicação pseudo-científica, que o autor vê com tanta relutância como a tentativa psicologicista de compreensão do fenómeno Mourinho e até como a consideração da astrologia como forma de conhecimento.

    Claro que podemos perguntar se as Ciências Humanas estão capacitadas para explicar o fenómeno humano na sua totalidade, se as técnicas metodológicas em que se apoiam são adequadas para compreender o homem, sobretudo quando nos limitamos a empregar instrumentos de análise empírica.

    O Bernardo opta por colocar as questões do lado da crença ou da fé, como ele próprio diz. “Eu acredito”. Mas será que a questão se esgota assim? Será que basta acreditar ou não acreditar? Em que acreditar? Não haverão razões para acreditar? A que fé dar o nosso assentimento?

    Despreocupado com a questão do estatuto científico da astrologia, o autor deste blog considera-a uma “ferramenta útil”, o que, num certo sentido, o aproxima do académico inglês, convencido também ele de que, independentemente do estatuto deste tipo de conhecimento, ele poderá ajudar a congregar forças, a motivar, a acalentar a esperança de que as nossas acções chegarão a bom porto.

    Por vezes funciona. Ficamos contentes com a força que nos dá. Por vezes não funciona e somos forçados encontrar uma razão ignorada para minimizar o seu fracasso. Umas vezes deixa-nos a sensação de que fizemos o que tinha de ser. Outras vezes leva-nos a pensar no que não deveríamos ter feito. Nuns casos como nos outros, a solução adequada estava lá; a nós competia-nos apenas ver com clareza…

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  2. E eu ainda estou à espera do meu mapa astral com explicação detalhada, que eu cá não percebo nada disso, e ainda não vi nada! NADA! Será que está assim tão mauzinho que é melhor eu não ver?

    Brincadeiras à parte, acho curioso (no mínimo) a parte do auto-conhecimento e das características de cad apessoa baterem tão certo quando se olha para um mapa astral. Seremos todos demasiado parecidos, afinal? que um mapa qualquer acerta em quase tudo em qualquer pessoa? Hum... What say you? TOS

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